Sobrecéu

 

“E o céu, estás a esquecer o céu, Sim, claro, o céu,

Os ventos, As nuvens, o céu, Sim, o céu.”

(José Saramago, in: O conto da ilha desconhecida)

 

 

Maria Laet, em seu novo trabalho, dialoga com a luz, com o céu e a copa das árvores. No silencio de seu discurso, a delicadeza sempre presente em suas obras. Na relação poética com os elementos da natureza, a promessa de um olhar amoroso. Na compreensão de que muito pouco podemos controlar, a beleza de permitir que o tempo determine os fazeres. É preciso deixar que o vento, as folhas, as nuvens encontrem espaços. Só assim então surgirá o que realmente interessa.

A imensidão da copa das árvores, num entrelace de galhos, folhas e cipós, forma algo como uma pele, uma membrana que liga e ao mesmo tempo divide espaços, por vezes permitindo que o sol penetre. É o sobrecéu, o dossel verde e denso das florestas. Maria Laet se interessa justamente pelos pontos de luz, pela força dos pequenos raios que ultrapassam o sobrecéu, encontram seu caminho por entre as copas fechadas e chegam para iluminar as florestas. E Maria quer retê-las, essas esferas tão perfeitas, essas frágeis projeções de luz que podem desaparecer a qualquer momento. Basta o vento, as nuvens, o tempo. A artista então descobriu como apreender o imaterial e o transitório em algo tão sólido e material como chapas de alumínio. E na poética da técnica, de repente o céu ficou a seus pés. O azul do céu é o mesmo azul do alumínio emulsionado. E deu vontade de falar sobre o céu e seus mistérios, sobre luz, sobre dentro e fora, entre e através. E dessa conversa nasceu Sobrecéu, obra que tem como matriz a copa das árvores, transforma luz em ação e revela muito mais do que o olhar percebe. Maria Laet, misturando delicadeza e intensidade, mais uma vez, questiona limites, espaços, mudanças e o poder da natureza que sempre a mantém cativa. Sobrecéu é mais um de seus gestos mínimos que esconde o poder da observação e da paixão.